“Bicas…o pulgão, que queria ser mágico”
Tudo
se passou num tempo distante, engraçado, divertido, mas sobretudo…mágico.
Nada
parecia o que era e o que era não parecia nada do que se observava.
Mas,
mesmo assim, havia um odor, um cheiro a poções, perfumes...comida e muita
alegria.
Bem…muita,
muita alegria nem por isso…pelo menos para o….Bicas.
Bicas
era um pulgão de roseira branca que, apesar do seu minúsculo tamanho, tinha
grandes expetativas, ideias e sonhos.
Como só gostava de
rosas brancas, a sua cor…bem cor não tinha, pois era…transparente.
A sua “casa”, a roseira onde habitava, encontrava-se num jardim, se bem que um jardim invulgar. Nele havia heras a sair de nuvens, pássaros que nadavam entre as folhas das árvores, peixes saltitantes como rãs e rãs que voavam como rápidos pardais.
Claro que, o Bicas, a
tudo isto estava habituado, e nada estranhava, não fosse o jardim pertença da
maior sumidade em magia, doutorado, com várias apresentações internacionais de
grande gabarito.
Evidentemente
que tinha as suas manias e uma delas era…ninguém podia pronunciar o seu nome.
─ Eu não vou
pronunciar o nome deles, xiça! Sou tão pequeno que não tenho fôlego para dizer aquele
enormeeee nome ─ disse o Bicas.
Bom….apesar
de ser pequeno, minúsculo, o seu sonho, o sonho da sua vida era tornar-se no “maior”
pulgão mágico da zona, aliás de todo o mundo, aliás do Universo.
- Pulgão tótó,
desvairado da moina…─ diziam os outros pulgões. Ele é como nós um ponto
minúsculo neste jardim e ainda por cima transparente. Ninguém o vê…e riam a
bandas despregadas.
Bicas
sentia-se magoado, triste, confuso. Ele nunca teria aquela atitude, ele nunca
ofenderia daquela maneira. Mas, mesmo assim, respondeu:
─ Ahahaha…vozes de burro
não chegam ao céu, o tamanho não interessa. O que interessa é realizar o sonho.
O ser
minúsculo tinha as suas vantagens, pois “espiar” o mágico e memorizar o que ele
fazia sem ele o topar, era facílimo.
─ Só tenho de estar de
olho em certas espécies que habitam na sala especial do mágico. – pensou de si
para si o Bicas.
De facto,
ele só tinha de ter cuidado com o Óscar, a osga, Arana, a Aranha, Laga, a
lagartixa, e Corneta, o corvo assim chamado, pois passava a vida a grasnar como
fazem os patos, mas era a sua voz.
─ Hum…eu penso que ele
se achava um pato. – riu baixinho Bicas.
De repente…
─ Está calada, Arana,
nem uma teia já sabes fazer em condições, pára osga desajeitada pareces uma
barata tonta. – grasnou Corneta.
─ Alto lá, qual
barata tonta, qual carapuça. Tu é que és um tonto! ─ disseram as baratas,
zangadas, que tinham acabado de sair de dentro de um livro intitulado O corvo tonto e a barata.
Com
medo de que as baratas lhe fossem baralhar as penas, pois com antenas
ameaçadoras estavam elas…calou-se e adormeceu.
─ Esta gente além de
perigosa é doida. ─ pensou Bicas…mas não falou alto, pois ainda o comiam.
─Tenho de passar por
eles até à sala secreta do mágico. Lá está o que procuro com toda a certeza.
Se assim
começou a pensar, assim começou a desenhar as ideias num pedaço de papel que
encontrou. Teria de atravessar aquele largo corredor sem perturbar os…bicharocos.
Passado
algum tempo…
─ Isto tem de dar
certo.
E,
cheio de confiança, determinação e coragem pulgónicas…começou a travessia.
Sempre
rentinho à parede e com “pezinhos de lã”, isto é uma maneira de falar que ele não
era cordeirinho e não tinha lã, quer dizer andar de mansinho sem fazer barulho,
iniciou a travessia.
A sorte
ajudou o Bicas.
O corvo
tinha adormecido, a aranha estava lá no alto, no canto, e como estava meia
pitosga não o via, a osga discutia com a lagartixa e o Bicas…deu às patas que é
uma pressinha e chegou à porta da sala.
─ Xiii…agora é que são
elas. – tremeu o Bicas ao olhar aqueeela enorrrme…porta.
Todas
as suas patas tremeram até parecia que tinha mudado de cor, como se o
transparente mudasse de cor. Deixa é passar as cores todas que se veem de um
lado para o outro.
De repente
lembrou-se:
─ Espera, eu sou
pequeno, a porta não toca no chão, então…passo por baixo.
Assim
pensou…assim fez.
─ Uauuuu!!!. Isto é ex-tra-or-di-nário.
Bicas,
de boca aberta, paralisou durante um momento perante tal…ENORMIDADE.
Ele
era estantes cheias de livros, caldeirões, pote, potinhos cheios de misturas,
mistelas e poções.
─ Ena pá, será que
tenho de arranjar uma sala assim? Eu vivo numa roseira.
Ora,
pensaria mais tarde no assunto, agora hora de procurar.
─ Irra vou procurar o
quê? De que preciso? O que escolher? O que estudar?
─ Queres uma ajudinha?
- disse uma voz rouca.
─ Aiii, que susto. Quem
falou? Quem está aí?
─ Sou eu, a abóbora.
─ Onde? Onde?
─ Segue o cheiro. –
disse a abóbora.
Bicas
seguiu o cheiro e olhando para cima viu uma ENORME parede cor de laranja.
─ Olá, que andas por
aqui a fazer? Não sabes que é proibido? ─ falou a abóbora.
─ QUE SUSTO, uma
parede falante. – disse o Bicas.
─ Eu não sou uma
parede, já te disse que sou uma abóbora.
─ Está acredito,
desculpa mas, nunca tinha visto uma abóbora.
─ E tu, afinal, és o
quê, nunca vi uma coisa como tu. ─ disse a abóbora com olhar desconfiado.
Enchendo
o corpo de ar e com olhar orgulhoso disse o Bicas:
─ Eu sou um pulgão de
roseira branca que quer e vai ser um grande mágico. O meu nome é Bicas e não te
esqueças.
Uma
risada com som a palha veio do outro lado da sala.
─ Quem se atreve a rir
de mim? Sou pequeno, transparente mas valente, corajoso e empenhado.
─ Se já se viu um
pulgão a ser mágico. É preciso estudar muito. – disse a vassoura, arrastando-se
até perto dele. Além disso és minúsculo e transparente.
─ Deixa-o em paz. ─
falou a abóbora mais velha e mais sábia. O livro que procuras está na
prateleira de cima.
─ Pois… e como vou
chegar lá? ─ pensou alto o Bicas.
─ Fácil! Eu dou uma
ajuda! Gosto da tua coragem e força de vontade – falou a vassoura.
Zás…uma vassourada e lá
foi ele.
─ Iupiiii…sou um
pulgão voadorrr.
PUM.
─ Ai, au, ui. ─ gritou
o Bicas. Irra que doeu!
Bicas
tinha batido com as antenas contra a capa de um livro.
─ Eu consigo ler isto,
o livro é do meu tamanho.
Imediatamente,
Bicas começou a lê-lo e…
─ Isto é um livro de
magia para pulgões. EUREKAAA.
Leu
o livro de uma assentada, todas as poções, feitiços e magias, tudo memorizou.
Depois
de bem dormir durante a noite e logo que o sol nasceu, foi para o seu jardim,
para a sua roseira.
A partir
daquele dia as suas roseiras brancas eram as mais belas, as mais brilhantes, as
mais cheirosas de todo o jardim do mágico.
Todos
os outros pulgões pediram desculpa por se terem rido dele e pediram-lhe ajuda
para que as suas roseiras também ficassem como assim.
Quem
ficou espantado com aquilo tudo foi o mágico que, penteando com as mãos a sua
barba, pensou:
─ Eu não me lembro de
ter realizado esta magia!!!
Assim,
a partir daquele momento, o mágico tinha o mais belo jardim do universo graças ao
esforço de um pulgão transparente de roseira branca.
Lutevi
26/10/2021